segunda-feira, 9 de abril de 2012

O que penduram nas varandas

Sinto a flor do
meu desejo penetrada feito anêmona
porque amar agora
e esquecer logo depois

então transcorre a revolução das anêmonas e eu fico órfão de holandas e
carente por canais
um barco sem a permissão de atravessar um rio
meu nome sem a certidão
mas enxergo até o final da rua
quebrar a expectativa com uma nova arquitetura
nos tijolos nas janelas no que penduram nas varandas

engolido pelo cadáver de uma baleia em Liège, tenho cinco minutos
para ver a praça em que um jovem como eu
fez um atentado
é uma graça
retorno à baleia e na banca de jornais vendem histórias em quadrinho em capa dura:
"notes de jérusalem" e "les derniers jours de stefan zweig" me chamam a atenção
busco aquarelas de petrópolis
uma praia no brasil
onde estou

benjamin se engana
somos todos narradores

o canal de sucção entumescido, poroso, espojoso, com tudo a que tem direito, no fundo do fundo do mar
margens de rios onde a polícia planta cadáveres de pessoas para brincar de História

atentado nos mantém
vivos mas sem
afirmar a vida

uma baleia inteiramente descascada
e morada de cracas feito
escultura de cobre pós-décadas submarinas
com algas
o descasque ao limite do osso
que sedimenta, decaindo
e é branco como se nada fosse.

Arraia da Lívia

Rios rasos e arraias correm
nele, em retas, em raias.
Do topo das palafitas
Os turistas
Olham.

domingo, 8 de abril de 2012

poema para meu pai

É fato consumado entre eu e as estrelas que me movo até paris na sexta-feira,

Meu corpo a experimentar a anarquia, sucursal de todos aqueles feitos rasgos, sem citizenship, com citizenship, um barco de refugiados e benjamin não está nele, um homem sem estado preso em paris e retorna a paris, três meses depois, minha viagem nem leva dois, já me sinto eternamente europa, me permito promenades ferroviárias sem destino absoluto, sugestões, caudas de bichos, léguas, visita de poucas horas a bruxelas, refugiados occupying a estação de trem, que limpeza na alemanha, bruxelas parece viva, bruxelas parece crise, mas como esteta sinto raiva do marxismo cultural nos exatos termos de breivik, deus esteja, ao mesmo tempo em que me emociono com o benjamin interessado - que me internou, que me escutou - no escritor como artesão, recurso à fala, praxis, experiência, isto é língua portuguesa, penso em kafka em tel aviv e como os garçons de israel em nada se pareciam com ele, eram ríspidos e burocráticos, para israel que está a quatro horas de colônia kafka e benjamin teriam sido a redenção, experiência na pobreza, meu crédito ainda cheio por estimular clitóris invisíveis, moluscos solícitos da minha família, este anti-tecnicismo de ambos, este heideggerianismo pós-45, fellow-traveller, a mea-culpa do grass, a culpa agora é do günter, acho que entendo meu pai,

Em constelação com as demais estrelas, adoto um sentido prático profundo, uma rotina de não estar em casa, de embebedar-me rápido demais para que me torne alcólatra, de ler mais nos rostos das pessoas e nos nomes das estações do que nos livros, estou sendo cínico, eu estou sozinho, mas espero que marchem comigo, rastejem comigo, superfícies estimulantes, nada de vil em rastejar, é o mais nobre dos movimentos, maior a superfície da pele, maior a superfície do solo,

Prezo pelo contato,

Mas quanto desvio quando me pedem para explicar o brasil a uma escola de alemães e os mais interessados são os filhos os netos dos turcos, e qual é a redenção quando à noite, madrugada de insônia em bruxelas, quatro horas de sono em que poderia estar em tel aviv, o quê, quem disse isso, acordo de sonhos perturbados metamorfoseado em gush emunim e percebo uma escamação violenta em todo o lado esquerdo do meu saco e penso "estes turcos são a teologia, as crianças são anões", eu jogo xadrês com os descendentes diretos dos vikings e tenho pena da turquinha que está apaixonada pela alemã que também está apaixonada,

E falo para meus últimos familiares judeus remanescentes neste velho continente sobre as últimas conquistas, como tenho me deslocado, se tenho me alimentado bem, a falta que me faz um buffet de self-service e como tenho tentado substituir isto por mulheres, desloco-me na livre circulação de pessoas e bens que ganhei com a wiedergutmachung, e nos presenteamos mutuamente, o que ganhei de alguém darei a outro, uma caixa de bonbons, por exemplo, seguramente não morrerá em minhas mãos, e que proveito tem tido meu corpo com isso,

"O fato da partícula nobre (quântica) não quer dizer que ela seja nobre, apenas se refere a uma propriedade de terra, uma região de origem", e também "nós, walter, descendemos do maimônides, e você tem no sobrenome bruch este acrônimo do rabi akiva", e eles acham que isto é muito, e eles acham que isso é pouco, mas por mais que rebe shimon seu discípulo seja uma figura meio zaratustra e eu tenha gostado de uma auto-imagem heremita-nômade, a veia mais grossa que agora pulsa tem sido a terra, por isso disse para von wedel "que engraçados os alemães, acreditarem que os nomes designam lugares", e a voz do trem disse "o nome de sua estação" e ela desceu em sua estação, e eu, sem maiores compromissos, digeri aquele beijo até a estação final, Wannsee.