domingo, 30 de outubro de 2011

CORETO (tentativa de recuperar um parque maçônico em Bruxelas)

Cantei à terra minhas maiores dores de ter de escavar-te por noites e noites de não encontrar-te na noite das noites
Na entrada do parque desfiz-me de medo, palácio aberto, bandeira estendida, o rei está lá, entrei pois no parque, a via era solta, os machos mordidos buscavam consolo, cruzavam paralelos, cônicos, nada me tocou, dimensão em que não estava, a ordem dos discursos a mim não se esticava, Ort der Melodie, palco das melodias, vestido na capa, no sombreiro, no guarda-chuva encantado, entrei no cadafalso em que ainda havia luz, rompi a descortina separando-me do azougue porcelana em pétalas de luz, melodia ainda solta, cada passo, desconsolo,
outro havia no lugar do que havia de estar lá,
vias todas em sinfonia, sincronia, no outono, perto de um abismo raso, em que me rasgo, ordem dos que compõem os livros, patíbulo, crisântemo, matérias-primas entre si, da morte, odes máximas, feições de minotauro, bênçãos do rabi milagroso, ontonímias, metológicas, ordenança dos bem-aventurados, as tetas em fogo, rosáceas em que esmago meus dedos sem perfume, em busca daquilo, do palco, do outro em que sussurravam ruídos nobres, a corte inteira diante, no centro das praças todas, alguém me diga, aqui também, no centro das praças todas brasileiras há sempre um troço desses, um edifício, não sei nomeá-lo, antes faltassem-me os olhos que a palavra perseguida,
abro-me em faces novas, mas me sinto menos novo, águas que me passam múltiplas pois vapor, ordens que não condeno, cordões que ato em mim, atos em despedaços, aula de aviação, ontem eu era tudo, hoje, perdão.

Submarino

Pescaria de baleias

No deserto de Aral

Transplantando os abismos

Do meu mar ao teu

É que eu amo as profundezas onde nunca entra luz

Verídicos corais onde ancoro sem por que

 

Submarino me buscou

Não havia tripulantes

Só Orfeu, meu velho amante

Renascido neste mar

 

Submarino me buscou

Não havia tripulantes

Todos mortos desde antes

Dessa história começar

 

Os marujos são mariscos

Cuja casca se quebrou

Mergulhei de tal maneira

Quase um salto ornamental

O oceano é sobretudo meu abrigo nuclear

Onde escrevo melodias inspiradas em você

 

Submarino me buscou

Não havia tripulantes

Só Orfeu, meu velho amante

Renascido neste mar

 

Submarino me buscou

Não havia tripulantes

Todos mortos desde antes

Dessa história começar

 

Se navego é pois preciso

Uma hora descansar

Eu não tenho mais destino

Remo por remar

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Telescópio, Teoscópio, Teleoloscópio, Teleholoscópio


Mirante-telescópio, dá-me a luz de cima
Revela no holofote o leão dos céus
Seus olhos são mentiras verdes plácidas
Me falta a coragem de jazer em paz

Eu vou atirar
À queima roupa
Vou me vingar
Do meu algoz

Tivesse o mero intento de me recompor
Escreveria um verso sem falar de amor
Renovaria as águas dessa correnteza
Entregaria a beleza inteira a seu dispor

Faria cianeto virar vinho
E ébrios gozaríamos sem pausa

Homero sempre quis abrir suas asinhas
Compor Alexandrinos para Prometeu
Voar até o fim do que chamamos Mundo
Roubar o fogo eterno e se aquecer no frio

Eu vou criar meu paraíso
E meus amigos não convidarei
Eu vou roubar dos céus o infinito
E o infinito, te prometo, não darei

Tivesse Homero intento de me recompor
Congelaria as águas dessa correnteza
Transformaria a beleza inteira em minha dor
Devolveria aos céus aquilo que roubei

Faria cianeto virar vinho
E ébrios nadaríamos sem asas

Busquei no oceano constelado aviso
Um tempo de azulejos imemoriais
Achei um caramujo que se decompunha
Deitei em sua concha e descansei em paz

Fabrico agora a casca que me prende à rocha
Buracos solidários deixam luz entrar
A luz revela cracas que me roem a pele
Entendo que a armadura viva jaz em mim

Vou devagar
Não tenho pressa
O tempo é mudo pra quem viu a luz
No fim do túnel do meu telescópio
Constelação imensa, falsa cruz

Tivesse o tempo livre por alguns segundos
Congelaria as águas em que escorre o mundo
Retomaria um texto que abandonei
Entregaria o manuscrito que por ora terminei

Faria cianeto virar vinho
E ébrio voaria até o Sol